Crítica - Morrer Como Um Homem (2009)


Realizado por João Pedro Rodrigues
Com Fernando Santos, Alexander David, Gonçalo Ferreira De Almeida, Jenni La Rue

A indústria cinematográfica está cada vez mais tolerante e aberta a novas explorações sociológicas e ideológicas, uma prova desse fenómeno de abertura é a grande aposta dos principais estúdios internacionais em argumentos centrados em temas relacionados com a homossexualidade, no entanto, apesar da notória liberdade e relativa despreconceitualização da indústria, o mundo invariavelmente artístico do transformismo é constantemente preterido devido à sua difícil comercialização, um risco que não impediu a concretização de “Morrer Como Um Homem”, uma corajosa e respeitosa produção de João Pedro Rodrigues que nos leva numa alucinante viagem até ao irreverente mundo do transformismo nacional.
A dramática narrativa desta valorosa obra cinematográfica é protagonizada por Tónia (Fernando Santos), uma veterana do espectáculo transformista lisboeta que subitamente vê desabar o mundo à sua volta quando o seu estrelato é ameaçado pela concorrência das artistas mais novas. A sua vida complica-se ainda mais quando começa a ser pressionada por Rosário (Alexander David), o seu jovem namorado, a assumir a identidade feminina, submetendo-se a uma operação de mudança de sexo. A partir desse momento, Tónia luta contra as suas convicções religiosas mais profundas porque se, por um lado, quer tornar-se a mulher que Rosário tanto deseja, por outro, acredita que perante Deus nunca poderá ser essa mulher. Num determinado momento, Tónia percebe que independentemente da decisão tomada, nunca poderá ser totalmente verdadeira consigo mesma e perante esse grande conflito interior, Tónia e Rosário decidem partir numa viagem mística que lhes marcará um encontro com Maria Bakker (Gonçalo Ferreira De Almeida), uma misteriosa transformista que irá despontar uma viragem completa na vida do casal.
A história verídica de Joaquim Centúrio de Almeida e Paulo Oliveira, dois famosos transformistas que viveram como mulher e marido durante nove anos e foram enterrados juntos como dois homens, está na base do argumento desta obra dramática que infelizmente não conseguiu traduzir as potencialidades da realidade transformista em qualidade cinematográfica. A excessiva construção melodramática da narrativa impulsionou a eficiência da sua vertente romântica mas diminuiu o efeito da sua vertente intelectual e moralista. O relacionamento amoroso entre as duas personagens principais é extremamente completo e profundo, exaltando constantemente a verdadeira essência do amor e da paixão entre seres humanos, sejam eles do mesmo sexo ou não. As inúmeras problemáticas sociológicas e psicológicas que actualmente afectam os transformistas não são abordadas com subtileza e engenho pelo argumento que, graças aos seus inúmeros excessos românticos e trágicos, não conseguiu exteriorizar uma fácil percepção e explicitação dessas amplas e complexas problemáticas. A narrativa é substancialmente interessante e genericamente aceitável, sendo minimamente perceptível para os mais desatentos e despreocupados, no entanto, uma maior aposta na criticidade e expressividade das problemáticas sociais e psicológicas do transformismo e transsexualismo, poderia ter fornecido mais elementos de interesse ao filme.
Depois de “Odete” e “O Fantasma”, João Pedro Rodrigues volta a apresentar-nos uma produção cinematográfica de grande irreverência criativa. Entre os elementos mais positivos desta sua performance, encontramos a sua incandescente visão do colorido e imaginativo mundo do transformismo e dos exuberantes homens que o protagonizam. A sua única grande falha residiu na sua incapacidade de editar convenientemente algumas sequências que aumentaram exponencialmente a duração do filme e que podem dispersar a atenção do espectador. O elenco é composto por vários profissionais do travestismo que oferecem credibilidade e realismo ao filme. O grande expoente máximo do elenco é o talentoso e criativo transformista profissional Fernando Santos que nos apresenta uma performance extremamente positiva e convincente. Apesar das imperfeições mencionadas, a experiência cinematográfica que “Morrer Como Um Homem” nos oferece é claramente positiva e altamente recomendável. Esta obra de João Pedro Rodrigues deverá agradar a todos os espectadores que apreciem uma agradável produção nacional que paute pela inovação e pela diferença.


Classificação – 3,5 Estrelas Em 5

Enviar um comentário

2 Comentários

  1. Eu gostei muito do filme!
    Parabéns ao realizador e a todos os actores, principalmente fernando Santos (Deborah Kristall), Cindy Scrash e Jenny Larrue.

    ResponderEliminar
  2. O FILME É UMA SECA PARABENS AOS ACTORES Alexander David, Gonçalo Ferreira De Almeida,

    ResponderEliminar

//]]>