Crítica - Something's Gotta Give (2003)

Realizado por Nancy Meyers
Com Jack Nicholson, Diane Keaton, Amanda Peet, Keanu Reeves.

Desde cedo Hollywood viu na comédia um poderoso hit. Capaz de atrair diferentes camadas de público, diferentes faixas etárias e enquadramentos culturais, a comédia é desde muito cedo uma das principais marcas do cinema de Hollywood. É relevante o facto de, por exemplo, as primeiras grandes estrelas de cinema – ainda no mudo – terem sido provenientes da comédia, Charlie Chaplin, Buster Keaton. Desde aí a comédia conheceu inúmeros desenvolvimentos, sendo um género que conseguiu estar sempre presente, mesmo em alturas mais negras como os anos 60 e 70. Apesar de, por vezes, ser um género não muito levado a sério, a verdade é que continua a ter grande aceitação junto do grande público. Uma das suas maiores variantes é precisamente aquilo que, popularmente, designamos "comédia romântica". Tal subgénero – ou variante – está de tal forma enraizado no nosso imaginário colectivo que já terá dado origem a um tipo de filme que, com um tom jocoso, gostamos de caracterizar como "boy meets girl". A ideia por trás de tal designação é literalmente o que a expressão em inglês pretende designar. Filmes cujo argumento poderá ser reduzido a uma aritmética básica: rapaz (bonito) conhece rapariga (lindíssima). Esse principio básico desdobra-se depois em diferentes variantes, sendo que diversos obstáculos são apresentados à relação, colocando em risco o seu sucesso. Ilusão cumprida, peripécias sucessivas. Resolução: o casal, à boa maneira de Hollywood, acaba por sobreviver. Simplificada que é esta exposição, penso que será suficiente para que se perceba que, de facto, o fime de Nancy Meyers, não sendo brilhante, é uma pedrada no charco.


Pois bem, este Alguém tem que ceder (2003), segundo filme escrito e realizado por Nancy Meyers (2003), assume-se como mais um passo de afirmação de Hollywood na sua capacidade para contar boas estórias. Alguém tem que ceder, mais do que um bom filme, é uma boa estória, fortalecida na tela com interpretações sólidas de dois actores consagrados e, mais ainda, por tudo o que ambos os actores representam fora da tela. De um lado, temos um Jack Nicholson vintage que acaba por passar para o filme todas aquelas ideias pré-concebidas que a sua personna de "estrela rebelde" suscita através da imprensa: um homem de 63 anos (Harry Sanborn) nada dado a compromissos, dono de um ego gigantesco, que, caprichosamente, parece ter imposto a si próprio a obrigatoriedade de apenas namorar com mulheres de idade inferior a 30 anos. Do outro lado temos a fabulosa Diane Keaton, interpretando uma escritora cosmopolita (Erica Barry), divorciada, também de meia-idade, sofisticada e independente, que, também ela, vê com algum desprezo relações com homens da sua idade. A faísca acontece quando ambos se encontram. Como base de tudo isto, temos o ingrediente indispensável: um argumento inteligentemente trabalhado, pela própria Nancy Meyers, repleto de referências cinematográficas (Paris… Casablanca…), com diálogos refinados e muito bem conseguidos. A realização segura o argumento, procurando sobretudo não se destacar. Apesar disso, o contributo de Meyers é importante, já que traz uma nova sensibilidade à comédia, aproximando-a de um público mais urbano e literário, que procura bons pedaços de entretenimento, habituando-nos a um registo de comédia apoiado numa suave ironia e diálogos que mais se assemelham a autênticas batalhas "de caneta em riste", tal é o grau de coloquialismo misturado com refinamento que os domina. Desde 2000, altura em que vimos estrear O que as Mulheres querem (What Women Want), até ao êxito mais recente, The Holliday (2006), Meyers imprimiu a sua marca, deixando-nos textos bem desenhados (no caso de Alguém e The Holliday) e realizações que, apesar de convencionais, não comprometem. Estamos perante a afirmação de uma escrita, não feminista, mas que procura mostrar um lado feminino às audiências de cinema.
O resultado é um filme curioso, que acabou por garantir uma nomeação para os oscars da Academia de Hollywood a Diane Keaton, num ano em que Charlize Theron arrecadou o prémio por Monster. É certo que provavelmente o filme não teria tido tanto sucesso se o elenco fosse outro, mas é Hollywood, e um filme é tudo isto.

Classificação - 3 Estrelas Em 5

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